sábado, 26 de maio de 2012

Simulacro, auto retrato e estranhamento

 

 
Gustave Courbet (1819-1877). O Desesperado (Auto-retrato), 1844-45. Óleo sobre tela, 45 x 54 cm. Colecção particular.

Autorretrato

"Nele, o artista se retrata e se expressa, numa tentativa
de leitura e transmissão de suas características físicas
e de sua interioridade emocional. O auto-retrato
é o espelho do artista."
(Katia Canton)

Tentando vencer a efemeridade da vida, o ser humano sempre buscou uma forma de representar e eternizar a sua imagem. Ao longo da história estas auto-representações adquiriram características que dialogavam com o contexto social e cultural em que vivam os artistas. Levando em conta esses contextos, vamos enfatizar as particularidades de dois deles: a idade média e o renascimento.

Como já sabemos, durante a idade média a religião torna-se o foco dos interesses humanos, é o que conceitualmente chamamos de teocentrismo. Nesta perspectiva, a providência divina era a responsável por todos os acontecimentos naturais, ou seja, uma tempestade ou uma grande nevasca só poderiam ser explicados pela vontade de Deus, que era o arquiteto maior (demiurgo), responsável por tudo. Como não poderia deixar de ser, durante esse período histórico as auto-representações não eram comunss. Elas foram deixadas um pouco de lado, já que os interesses dos artistas estavam concentrados no mundo divino. Contudo, no final desse período, um artista chamado Giotto se destacou por se auto-representar.

Já no caso do renascimento, a dinâmica é outra. A razão será acessada para explicar todos os fenômenos. Deus perde o seu lugar central e o homem acaba por voltar-se para si mesmo, é o que podemos chamar de antropocentrismo. Durante esse período o auto-retrato se transforma em um dos principais meios de expressão dos artistas. Eram através deles que seus autores podiam expor suas idéias, percepções e visões de mundo.

Viajando na velocidade da luz pela história, o auto-retrato será utilizado na arte contemporânea de uma forma totalmente diferente da maneira narcisista que ele era produzido até então. O que isso quer dizer? Se antes os artistas procuravam eternizar auto-imagens perfeitas, bem acabadas tecnicamente, na atualidade o interesse é causar uma sensação de incômodo, de estranhamento. É como se pudéssemos olhar num espelho e não nos reconhecer. É como se a imagem refletida fosse a imagem de outra criatura (ausência de identidade).

"Essas emoções estão ligadas
à situação do ser humano contemporâneo, inserido numa sociedade
de informação eletrônica e virtual, pressionado pela
mídia, sufocado pelas imposições velozes do tempo e espaço
que se configuram na realidade cotidiana das cidades."
(Katia Canton)

Norteados pela idéia do auto-retrato como estranhamento, analisamos a produção do artista amazonense, que vive no Recife, Rodrigo Braga. Dois de seus trabalhos foram investigados: o primeiro chamado "da alegoria perecível" de 2005, Rodrigo se apresenta usando "adareços" um tanto fora do comum. Pés de galinhas e uma língua de boi foram colocados na boca. Os óculos foram substituidos por enormes olhos de peixe. Outro peixe ganhou nova utilidade na cabeça do artista podendo ter substituido um chapéu ou boné.

Nesse curioso trabalho, as alegorias perecíveis (perecível é aquilo que se estraga com facilidade) servem de metáfora às inúmeras máscaras que fazemos uso no nosso dia a dia. Você já deve ter passado por uma situação onde teve que mudar seu comportamento por estar num lugar onde não é possível falar alto, por exemplo. O seu comportamento dentro de um shopping não é o mesmo que você tem numa igreja. Para além de questões comportamentais, as máscaras são utilizadas para esconder algo ou construir novas identidades.

Pensando no desejo de ser uma outra coisa, o segundo trabalho analisado, "fantasia de compensação" de 2004, metaforicamente remete a aquisição da ferossidade de um cão. A manipulação digital, técnica utilizada para realizar o trabalho, apresenta a fusão do rosto do artista com o fucinho de um cachorro da raça rottweiler, conhecido pela sua agressividade. Rodrigo uma figura pacata, muitas vezes importunado, quando criança, por coleguinhas de escola, desenvolveu durante adolescência uma doença conhecida como síndrome do pânico. Suas relações interpessoais foram afetadas pela doença, deixando o artista meio isolado dos outros. O sentimento de solidão era imenso. A distância entre ele e as outras pessoas poderia ser medida como uma ponte intransponível. Tentando ultrapassar as dificuldades de sua timidez, Rodrigo resolver externar essa vontade se transmutando num cachorro feroz, que simbólicamente estaria preparado para lidar com um mundo conflitante.


"Da alegoria perecível", 2005


"Fantasia de compensação", 2004

O endereço do site do artista em questão se encontra nas referências bibliográficas, e pode servir de ferramenta para aqueles alunos que se interessaram pelos trabalhos analisandos. No mesmo site existe imagens de outros trabalhos de Rodrigo Branga. Também nas referências existe um link para uma entrevista dada por ele para o site doispontos.
SE DIVIRTAM!!!!


Referências bibliográficas:
Auto-retrato / Instituto Arte na Escola ; autoria de Silvia Sell Duarte Pillotto ;
coordenação de Mirian Celeste Martins e Gisa Picosque. – São Paulo : Instituto
Arte na Escola, 2006.
Site visitados:
http://www.rodrigobraga.com.br
www.doispontos.art.br/tema.php?cod=821/
(Entrevista com o artista)

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